segunda-feira, 22 de novembro de 2010

O lobby do tabaco prejudica a nossa saúde

Professor Wilson,

Reportagens publicadas pela Folha de S. Paulo neste domingo e segunda-feira últimos (14 e 15/11/2010) dão conta do embate interminável entre as entidades e pessoas comprometidas com a saúde dos cidadãos e um contumaz fabricante e comerciante de drogas (infelizmente consideradas lícitas): o setor do tabaco.
Com o título " OMS quer proibir aditivos no cigarro", a reportagem de domingo dava conta de reunião marcada para esta semana no Uruguai com o objetivo de aprovar novas diretrizes para regulamentar os produtos do tabaco, com especial atenção ao uso de aditivos (açúcares, flavorizantes e umectantes, entre outros).
Todos sabemos que a intenção da indústria do fumo, com esta adição, é aumentar o poder de fogo da nicotina no sentido de causar dependência, como bem acentua a pesquisadora brasileira Tânia Cavalcante, e, em muitos casos, de disfarçar o gosto ou sabor do fumo. Os aditivos são tóxicos, mas evidentemente representantes do tabaco, com a sua hipocrisia e cinismo naturais (pois não defenderam durante muito tempo que o cigarro não causava câncer, embora soubessem desta relação nefasta!), negam tudo, buscando apoio em pesquisas que só eles mesmos conhecem e defendem.
O argumento mais utilizado pelos que fabricam e vendem drogas (como o tabaco) é que há muita gente empregada no setor e que qualquer tentativa de regulamentação provocaria um problema social importante. Não há como negar que existem milhares de brasileiros que sobrevivem à custa desta droga tida como lícita (e que mata sem dó milhões de pessoas em  todo o mundo anualmente), mas esse fato não pode impedir que medidas adequadas sejam tomadas para salvar outras centenas de milhares de pessoas em nosso País. O governo e a sociedade precisam buscar outras alternativas que não seja deixar-nos reféns de setores e empresas que contribuem para degradar a vida e a saúde de todos nós.
Não se pode ignorar que, depois do cerco cada vez maior dos governos de países desenvolvidos, a indústria de tabaco tem avançado agressivamente sobre os cidadãos dos países emergentes ou subdesenvolvidos com o objetivo de manter os seus lucros, mesmo que à custa de prejuízos incalculáveis para os sistemas de saúde nacionais. Segundo a reportagem publicada na última segunda-feira com o título "Lobby do tabaco visa países emergentes", "dos 176 milhões de mortes ligadas ao tabaco que estão previstas para 2005 a 2030, 77% vão ocorrer em países em desenvolvimento", com um custo anual para a economia global (pelas mortes, doentes, mutilados etc) de 500 bilhões de dólares, segundo estimativa da Fundação Mundial do Pulmão.
Enfim, o lobby, preocupado em garantir os seus privilégios - a ganância da indústria do fumo é descomunal - anda pesadíssimo, incluindo, conforme reportagem da Folha, "contribuições para campanhas políticas, auxílio para a redação de novas regras relativas ao tabaco e, pelo menos em dois casos, pagamento de propina para garantir legislação favorável" (15/11/2010, p. C7). Por aqui, convivemos com a bancada do tabaco no Congresso, com a complacência de governantes (ou postulantes a cargos executivos) com a indústria e com os sindicatos (vide a última campanha presidencial) e com a falta de vigilância com respeito à propaganda insidiosa do cigarro em comunidades, eventos esportivos (Fórmula 1) etc. Pra não falar do apoio recente da Souza Cruz para evento de representantes da justiça brasileira, o que já ocorreu em outras oportunidades também (não há conflito de interesses nisso?), e que tem merecido reação de setores responsáveis da sociedade brasileira.
Temos sido no Brasil complacentes demais com a indústria do tabaco que, pelo menos nos Estados Unidos, foi obrigada a assinar acordo com o governo de vários Estados em um valor considerável (bilhões de dólares), o que deveria ser repetido aqui, se fôssemos levar a sério o prejuízo formidável que ela causa ao setor de saúde.
Está na hora de uma cruzada séria contra a indústria do tabaco apoiada na tese de que não se pode tolerar a fabricação e a venda de drogas, sejam elas quais forem. Mas, ao que parece, governos andam preocupados com a arrecadação de impostos e jogam com timidez contra esse vilão mundial. Se  o problema é arrecadar impostos, por que não aumentar ainda mais o preço do cigarro? É sabida a relação entre a redução do consumo do produto e o preço  continua sendo comparativamente, por aqui, um dos mais baratos de todo o mundo.
O velho argumento do contrabando,  de que os capitães da indústria do tabaco costumam lançar mão toda vez que se fala em restringir o consumo do cigarro, incluindo regulamentações como a que se propõe agora ou o aumento de preço, não faz sentido. Contrabando é crime e deve ser combatido com rigor, mas ele não pode servir como álibi para um outro crime que acontece diante de nossos olhos: a investida dos fabricantes de fumo sobre os nossos jovens, particularmente os menos favorecidos.
A indústria da droga lícita (até quando?) está faturando alto e precisa ser sufocada sem pena. Não se pode conviver com este discurso cínico e com esta prática lesiva ao futuro da nação brasileira.
Respeitemos os fumantes, que precisam de apoio psicológico, de maior atenção do setor de saúde oficial, de campanhas mais competentes de esclarecimento, mas não devemos dar trégua aos que fabricam e vendem cigarro.
Tenho repetido: não é coincidência (Freud explica?) o fato de que os dois maiores fabricantes de cigarro por aqui tenham "cruz" e "morris" no nome. Seus produtos matam lenta mas impiedosamente e por isso eles merecem marcação cerrada.
É preciso neutralizar este lobby espúrio, desmascarar este discurso cínico da responsabilidade social (pois não é que uma revista brasileira concedeu prêmio de sustentabilidade - ???? - para a Souza Cruz, uma empresa que não sustenta, muito pelo contrário, nem a saúde ou a vida dos seus clientes!) e jogar duro contra quem fabrica e comercializa drogas (lícitas, por omissão de muita gente!).
As novas gerações dependem de políticas públicas de saúde que não sejam cúmplices de setores poderosos que se locupletam à custa da deterioração absurda da nossa qualidade de vida.
Onde há fumaça (de cigarro) há doenças. Vamos responsabilizar de vez a indústria  do tabaco pelos males que causa ao SUS, exigindo indenizações bilionárias como fizeram os EUA.  Vamos aumentar brutalmente o preço do cigarro e combater ferozmente o contrabando. E dar apoio integral ao Ministério da Saúde, ao INCA, à ANVISA e a todos aqueles que, diferentemente dos fabricantes e vendedores de drogas, estão empenhados em preservar a nossa qualidade de vida.
Drogas (lícitas ou não) precisam ser banidas, assim como os que as promovem. O futuro sustentável do planeta depende também da eliminação deste cancro que há séculos vem corroendo a nossa civilização. Pra acabar com a indústria do cigarro só há uma saída imediata: avançar no bolso das empresas como elas avançam sobre nossos pulmões, bexigas, gargantas etc. É jogo duro, mas ele precisa ser ganho. Está mais do que na hora de virar esta partida. A sociedade e os nossos netos nos agradecerão para sempre.

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